Press ESC to close

Você riu quando Trump falou da Groenlândia. A China não.

O degelo no Ártico não gerou apenas novas rotas de navegação. Reabriu uma disputa geopolítica latente entre potências que enxergam, sob o gelo, um ativo que vai além dos recursos naturais: o controle das cadeias futuras. A Groenlândia, o arquipélago de Svalbard — localizado entre a Noruega continental e o Polo Norte — e o corredor do Mar do Norte passaram a integrar o núcleo estratégico da nova disputa por supremacia econômica, energética e informacional.

A proposta de Trump em 2019 para adquirir a Groenlândia foi tratada como excentricidade. Não era. A ilha concentra 43 dos 50 minerais críticos definidos pelo Departamento de Energia dos EUA — insumos essenciais para tecnologias de armazenamento, condução e transmissão de energia. Em um mundo orientado por circuitos elétricos e fluxos logísticos, esses minerais definem não apenas o custo da transição energética, mas a capacidade de sustentá-la.

Mais que isso, a Groenlândia abriga a base aérea de Thule, ponto nevrálgico de vigilância aeroespacial americana. Controlar esse posto é garantir superioridade em alerta antecipado, rastreamento orbital e defesa antimíssil. A leitura de Trump não foi improvisada: trata-se de antecipar uma reconfiguração do sistema mundial a partir das margens frias do Atlântico Norte.

Do outro lado, a China se move em silêncio. Em 2004, formalizou presença em Svalbard, com base no tratado internacional de 1920, que garante acesso não-militar ao arquipélago. Desde então, Pequim ampliou sua atuação científica na região, conectou Xangai a São Petersburgo via rotas polares, e realizou manobras navais conjuntas com a Rússia no Pacífico Norte e no Mar de Barents. Sob retórica técnica, o país asiático avança sobre uma zona que até pouco tempo era ignorada pelas grandes potências ocidentais.

A resposta americana tem sido reativa. Pressão sobre a Dinamarca, reforço da aliança com o Canadá, modernização do Comando de Defesa Aeroespacial e apoio à Noruega no reforço de sua presença militar em Svalbard. A Rússia, por sua vez, denunciou a movimentação como violação do tratado que proíbe a militarização da região. O pano de fundo é evidente: neutralidade jurídica e desmilitarização territorial entraram em conflito com a lógica de reposicionamento estratégico.

Há ainda o fator logístico: as rotas do norte — especialmente a Passagem Nordeste, ao longo da costa russa — encurtam o trajeto Ásia–Europa e reduzem vulnerabilidades a bloqueios navais, como os do Estreito de Malaca. A China, dependente dessas cadeias para abastecimento energético e industrial, vê na chamada “Rota da Seda do Gelo” uma alternativa concreta em caso de conflito.

O Ártico deixou de ser periferia climática e tornou-se núcleo estratégico. Minerais, bases de rastreamento, cabos submarinos, portos e rotas congeladas desenham o novo mapa do poder. Quem está posicionado ali não apenas influencia os fluxos — tem o poder de interrompê-los.

O episódio mais recente do programa Geoeconomia mergulha nesse tema com dados, contexto histórico e análise estratégica. Se você quiser entender por que o Ártico virou o novo eixo da disputa global, assista ao episódio completo clicando aqui.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *